/Comentário da entrevista de Jorges Forbes, a revista Marie Claire, n. 178, de janeiro de 2006

A princípio, na nota introdutória, o trecho “…com uma boa dose de utopia a vida fica, no mínimo, mais divertida”, pode parecer uma idéia um tanto quanto “carpe diem”, que diz da obediência ímpar aos desejos e afirma que os desejos se dão, apesar da realidade restritiva. Este trecho instiga o público alvo, propondo uma solução, no entanto, que está além dos limites globais, talvez na irrealidade, talvez na surrealidade, e convida o leitor a conhecer um novo espaço de desejar, até provar o real.

O que é real? A célebre e polêmica pergunta filosófica com tamanha diversidade de respostas e interpretações, tal qual seu objeto, é encarada na entrevista. Assim como as mudanças que ocorreram no decorrer das eras, a realidade também mudou. Real é o que sempre escapa: a pedra no meio do caminho. De vez em quando, fazemos dele realidade, que toma o relevo da paisagem da época. A realidade é inventada, moldada nos sonhos e desejos daqueles que a vivem. Ela está sob constante mudança: críticas à anterior fazem com que a impressão de evolução se dê. A necessidade de hoje cada vez mais as pessoas se responsabilizarem pelos seus desejos, está intimamente ligada à necessidade de se pensar evoluindo, de fazer melhor do que antes fizeram. Para onde vai a evolução? E a realidade? É necessário inventar. O sucesso da invenção, na era da globalização, é condicional à sensibilidade do indivíduo.

Após a transição da era industrial para a globalização, a sensibilidade se torna cada vez mais imprescindível para lidar com a multiplicidade de escolhas que se tem de fazer. Essas escolhas angustiam na medida em que o número de opções é grande, explico: ao fazer uma escolha entre dez, não se pensa na possibilidade de um acerto e sim na probabilidade das outras 9 serem, talvez, bons palpites. Por isso, em meio a esse desbussolamento, é válido o método descrito na entrevista; projetar seus sonhos mais utópicos com a consciência de que eles não se realizarão concretamente, mas perceber que esses quereres utópicos dão pistas sobre os desejos que, de fato, se quer. “Nada é impossível ao homem, pois, se fosse, ele não o faria.”, defende Jorge Forbes.

Para desejar é necessário ousadia, querer desejar sem compromisso com a realização explícita, que muitas vezes não se dá, fato gerador de queixas intermináveis, que alguns incorporam como um estilo de vida, quase um dogma. A dor é solidária e o sucesso é solitário. Logo, com a angústia diante das escolhas, frente à dificuldade de inventar soluções singulares; se copia, se apóia, gerando o uso abusivo de drogas, da onda da depressão e devoção a instituições neo-religiosas. A indignação é geral, a ação, porém, é singular.

A musica eletrônica revela a tendência egoísta-dependente da geração mutante; na qual a dança no escuro é egoísta, introspectiva, porém, está diretamente relacionada ao movimento da multidão de pessoas que seguem na mesma batida, juntos e singulares. Cada um participa de uma maneira pessoal para o homogêneo movimento: dança-se consigo mesmo e com todos ao mesmo tempo, estabelecendo uma relação paradoxal.

Para não se deixar levar apenas pelas batidas, é necessário reinventar, questionar essas batidas que indicam trilhas. É válido inventar seus desejos e também os meios para torná-los reais; há que querer. “Quem não se reinventa está de mal com a vida. Se nem você sustenta seu desejo, quem vai sustentar?”.

Baleia, 6 de janeiro de 2006, remix por Francisco Forbes