/Memória Mensal – Ano 1 – N° 3

Março de 2008

  1. Nova pesquisa em parceria com Genoma: o impacto do diagnóstico sobre a família dos afetados
  2. A análise leva uma pessoa à conquista da honra
  3. A primeira clínica de Lacan está para a metáfora assim como a segunda, para a metonímia
  4. IPLA alinha a clínica-escola à clínica psicanalítica no Genoma/USP

  1. Genoma: “Desautorizando o sofrimento”, a primeira pesquisa que resulta da parceria do Projeto Análise e IPLA com o Genoma Humano/USP prossegue, agora, com mais uma linha de investigação: o impacto do diagnóstico sobre a família dos afetados pelas patologias genéticas graves. Nestes quase dois anos de atendimento aos portadores, os familiares que eventualmente os acompanharam foram ouvidos na primeira entrevista, quando assim o quiseram. Não foram raros os casos em que apresentaram mais dificuldades e reagiam pior que os próprios doentes. Para responder a isso, o trabalho com os familiares está orientado por ao menos quatro coordenadas a serem verificadas: 1. a surpresa com o diagnóstico; 2. a hereditariedade ou não da patologia; 3. a reação de culpa e 4. o (não) lugar do irmão do afetado. O objetivo terapêutico privilegiado é deslocar esta pessoa da posição de culpa para a responsabilidade.
  2. Honra: O que uma análise tem que deixar para uma pessoa é a honra. É o que diz Lacan no seminário XVII. Jorge Forbes o recupera, valendo-se do clássico Os Três Mosqueteiros, de Alexandre Dumas. Naquela obra, D’Artagnan, recém chegado à Paris, envergonha publicamente aos três mosqueteiros. Não foi intencional, mas ele não se desculpa pelos maus encontros que teve com Athos, Porthos e Aramis. O verdadeiro nobre não se explica, nem se justifica, ele faz o que tem que ser feito. E, por isso, conforme o código de conduta daquela época medieval, ele deveria duelar com os três respectivamente. A vitória restituiria a honra ao vencedor. D’Artagnan é então reconhecido como um nobre quando somente pede desculpas para o caso de a morte o impedir de cumprir seu desígnio. Aristocrata, para além de um status social, é a posição de quem sabe que a honra é paga com sangue, com o próprio sangue. Já a culpa, com o sangue de outrem, do Cordeiro de Deus, conforme o cristianismo ensinou ao mundo. O padre absolve e impõe penitência. A psicanálise não desculpa, não perdoa, em nenhum sentido. Uma pessoa tem de responder ao que se passa com ela, tendo tido sua participação ou não. Este é o sentido de ser responsável. Se a resposta é a mais apropriada isso se verificará ao depois, o que por sua vez pedirá nova resposta e assim por diante. Assim, a vida volta a ter movimento.
  3. Metonímia. Especialmente na lição 3 do seminário XVIII – D’un discours qui ne serait pas du semblant – Lacan diz que numa análise, o manejo de linguagem que merece ser privilegiado pelo analista é a metonímia. Ele tem de deslizar com a palavra e não substituir um sentido por outro. A metáfora foi o método predominante na interpretação. Foi o que levou Freud a concluir que a análise seria interminável e esbarraria, para o homem no temor da castração e para a mulher, no protesto feminino ou inveja do pênis. Lacan percebe um embaço que permanece intransponível. Na experiência humana, a conta da satisfação nunca fecha, sempre fica um resto. O nome que Lacan deu a isso foi mais-de-gozar. Por mais que se tente interpretar a insatisfação de uma pessoa, não há justo acoplamento. É como na mais-valia, de Marx, em que há um a mais que o salário não interpreta. A metáfora é uma compreensão. A metonímia, uma alusão. Lacan assegura que ao gozo se chega por alusão.
  4. IPLA – O Instituto da Psicanálise Lacaniana está dedicado a viabilizar o atendimento das pessoas que se inscreveram na clínica-escola. Uma comissão de quatro analistas de maior percurso se encarregou de fazer a primeira entrevista com os pacientes. Na seqüência, encaminharão o caso para ser seguido pelos participantes do Corpo de Formação. Segundo critério estabelecido por esta comissão ética, só será permitido atender àquele que tiver análise e supervisão. Os casos serão periodicamente apresentados em discussões clínicas no IPLA. Após três meses, o paciente será revisto pelo primeiro entrevistador, que avaliará em que medida se alcançou os objetivos terapêuticos inicialmente estabelecidos. Desta forma, a clínica do IPLA se alinha à clínica psicanalítica no Genoma/USP. Este esquema de trabalho fará andar a fila dos que esperam pelo tratamento.

Helainy Andrade – 4 de abril de 2008