/A plasticidade do cérebro e a psicanálise

Uma introdução ao estudo do tema – A plasticidade do cérebro e a psicanálise

por Teresa Genesini

Iniciamos nosso estudo desse tema através do livro “À chacun son cerveau: Plasticité neuronale et inconscient”, uma obra escrita a duas mãos:

  •    Pierre Magistretti, (suíço, nascido em 1952) – médico e neurobiólogo, especialista em metabolismo cerebral.
  •    François Ansermet (suíço, nascido em 1952) – psiquiatra e psicanalista.

Magistretti e Ansermet se conheceram em um seminário de história da medicina e escreveram em 2004 esse livro onde mostram que dois mundos que pareciam inconciliáveis – o da psicanálise e o das neurociências – confluem para uma reconciliação através do conceito de plasticidade.

O fenômeno da plasticidade demonstra que o cérebro não é um órgão estático e que evolui durante a vida, guardando as marcas das experiências vividas. Esse conceito introduz uma nova visão do cérebro.

Segundo os autores, a plasticidade demonstra a unicidade de cada indivíduo – cada sujeito é, em certa medida, modelador do seu próprio cérebro. O sujeito, tratado como singular, uma exceção do universal, é agora uma questão central também para as neurociências, como já era para a psicanálise. A partir dessa confluência, esses estudiosos apostam numa nova vertente desses campos tão acostumados a serem rivais. Apontam a possibilidade de um novo caminho com a pergunta: _ Acaso o sujeito da psicanálise e das neurociências não é o mesmo?

A hipótese norteadora desse livro é a existência de um modelo do inconsciente que integre os dados recentes da neurobiologia com os princípios fundadores da psicanálise. Segundo Ansermet, Freud já havia pensado na hipótese de plasticidade, que hoje pode ser confrontada com os trabalhos recentes no campo das neurociências, como o do prêmio Nobel concedido a Eric Kandel em 2000 (1). Sugere que a psicanálise deveria seguir a direção aberta por Lacan quando este se perguntava se haveria uma ciência que incluísse a psicanálise. Já as neurociências deveriam encontrar na psicanálise um ponto de apoio necessário para orientar-se, finaliza.

Genética: Plasticidade e epigênese (2) estão vinculadas num mesmo projeto. Considera-se que entre o genótipo e sua expressão fenotípica operam a incidência da experiência e do impacto do ambiente – uma interação que modula a expressão do genótipo. A idéia dos autores é que a determinação genética não seria maior que a determinação ambiental ou psíquica, mas ao contrário, seriam duas determinações cuja articulação deve ser pensada através do fenômeno da plasticidade.

Como pensar a relação entre neurociências e psicanálise, a partir do conceito de plasticidade? Não seria uma reunião das duas áreas porque esse modelo implica numa desnaturalização das características próprias de cada uma, confundindo neurociências e psicanálise num conjunto indiferenciado. Uma relação de interseção entre elas por meio da plasticidade seria o caminho possível. É a proposta do livro.

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(Fontes: entrevista de Ansermet e Magistretti para a revista Reflex – 15/9/2007; artigo Psicoanalisis e Neurociencias – 21/10/2006 e prefácio do livro.)

(1) Eric Richard Kandel (Viena, 7 de Novembro de 1929 – ) é um neurocientista da Áustria, naturalizado cidadão estadunidense. Foi premiado, juntamente com o sueco Arvid Carlsson e o com o estadunidense Paul Greengard, com o Nobel de Fisiologia ou Medicina em 2000, pelas descobertas envolvendo a transmissão de sinais entre células nervosas no cérebro humano.

(2) Epigênese deriva do termo “epigenético” que significa “o que acrescenta, ou o que está acima (além), da genética”. A epigênese refere-se a tudo o que não é determinado pela genética, isto é, corresponde as modificações transmissíveis e reversíveis das expressões dos genes, mas que não impliquem modificações nas sequências de ADN (Ácido desoxirribonucléico).